30 de setembro de 2010

Ao som da Noite

No caminho tudo que passava parecia um bom texto.
Na volta, um cotovelo na janela, e uma unha coberta do amargo de um esmalte de quinta. Não sei dizer o que era mais amargo.
Na volta, um bêbado tentando se equilibrar no meio fio. Uma linha horizontal que na visão dele poderia ser uma vertical, uma reta, uma torta. A garrafa do bolso da frente, e a do bolso de trás faziam o mesmo caminho (tentavam), a da mão era a preferida. Pelo menos peso não faziam mais. E os faróis amarelos faziam o mesmo caminho.
O nó que rasgava garganta a dentro apertava lentamente, a saliva não tinha mais o fluxo natural.
Minutos intermináveis. 

… faz força pro tempo parar.
Só vi no caminho os estilhaços, dos faróis amarelos que só queriam fazer seu caminho a sua maneira. Depois dali não via mais nada.
Vi nos estilhaços o reflexo das luzes dos postes, o amarelo incandecente dos postes. Refletia uma luz radiante e vibrante, amarela.
Em algum momento as garrafas se envergonharam de ser um peso, as entornou antes que pendessem e o deixasse nu em pleno meio fio.
Os cacos estão no caminho, as lâmpadas nos seus postes, as garrafas secas.
A garganta descobriu como é se sentir sozinha em meio a tanta garrafa.
Ela tinha sede.
Ela tinha um nó.
Ela secou.
Só foi digna de um gole, pela fidelidade de um velho bêbado que trançava a noite, ao som do meio fio.

(Antigo texto postado no LeBlog, Wordpress)

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